Opinião de João Vasconcelos
O atual quadro político a nível nacional, assente numa nova maioria parlamentar, resulta como se sabe, do entendimento entre o Partido Socialista e outros partidos à sua esquerda, onde se inclui o Bloco de Esquerda. O XXI Governo Constitucional inaugurou uma nova era de esperança num país fortemente devastado, durante quatro anos, pela coligação de direita PSD/CDS. Coligação que não olhou a meios para atingir os fins e que atuou como mera executora da troika estrangeira. Aliás, as suas políticas de destruição tiveram o mérito de ultrapassar, e muito, as próprias políticas preconizadas pela troika.
A título de exemplo, refira-se o flagelo de mais de um milhão de desempregados, as muitas centenas de milhares de novos precários, a emigração de mais de 100 mil pessoas por ano, as manchas de pobreza que alastraram como bola de neve, a degradação e encerramento de serviços públicos, a destruição de direitos sociais.
O acordo visou quebrar o ciclo de empobrecimento e minimizar as terríveis medidas de austeridade que vinham sendo impostas ao país e aos seus cidadãos. Trata-se de um acordo para recuperar rendimentos, defender os salários e pensões, defender o emprego, combater a precariedade, aumentar o nível de bem-estar dos cidadãos, melhorar e defender os serviços públicos, com destaque para o Serviço Nacional de Saúde, a Escola Pública e a Segurança Social Pública.
O Orçamento de Estado para 2016 corres-ponde, em parte, aos acordos assinados com os partidos da esquerda parlamentar. Trata-se, no entanto, de um Orçamento muito insuficiente na ótica do Bloco de Esquerda. O fraco aumento dos salários e pensões e as limitações orçamentais na educação, ou na saúde, são dois exemplos dos resultados pouco ambiciosos de um governo que tem dificuldade em fazer frente a Bruxelas e a Berlim. A obediência ao Tratado Orçamental não se compadece com a execução de políticas progressistas e a construção de um Orçamento digno de um verdadeiro Estado Social. Foi assim, acertada, a recusa do Bloco de Esquerda em participar num governo comum.
Cabe ao Bloco de Esquerda cumprir e fazer cumprir os acordos assinados, procurando aprofundá-los com vista a obter mais conquistas para os trabalhadores e o progesso social. É o que pressupõe o acordo para o mínimo de uma legislatura. Além da continuação do caminho trilhado com a recuparação de pensões e salários, a defesa do emprego e dos serviços públicos, é necessário e urgente aprofundar os níveis de bem-estar das populações, procurando responder às suas exigências e solucionando as suas reivindicações. Em todo o território nacional e onde se inclui a região do Algarve.
É o Partido Socialista e o Governo de António Costa que têm a chave para a continuação da necessária estabilidade governativa, com políticas anti-austeritárias, impedindo assim o regresso das “noites de pedra” da direita. É preciso atender e ouvir os clamores, os gritos, as aspirações das populações, daqueles que mais precisam. Caso contrário, será uma enorme desilusão e mais uma esperança que se esvai. E todos perderemos.
Nos últimos tempos algumas sombras negras toldaram o clima de relacionamento no Algarve – que deverá ser bom – entre o Bloco de Esquerda e o Partido Socialista. Esperemos que sejam apenas sombras passageiras. Esta situação deve-se ao facto de, na Assembleia da República, os deputados do PS, incluindo os eleitos pelo Algarve, chumbarem as iniciativas alusivas a esta região propostas pelo Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda. Estão neste caso o Projeto de Resolução propondo a suspensão imediata das demolições nas ilhas barreira da Ria Formosa (que o PS anteriormente defendia), e a proposta de alteração ao orçamento na especialidade para acabar com as portagens na Via do Infante (o Algarve encontra-se exangue e não aguenta por muito mais tempo uma tragédia com dez mil acidentes por ano, grande parte ocorridos na fatídica via EN 125).
Num futuro mais ou menos próximo, novos Projetos do Bloco de Esquerda, relativos ao Algarve, subirão a plenário na Assembleia da República, envolvendo entre outras matérias, o Cen-tro Hospitalar do Algarve, a prospeção e exploração de hidrocarbonetos e, de novo, a isenção de portagens na Via do Infante. O que se espera é que haja bom senso entre forças políticas que suportam o mesmo governo. Na prática trata-se de atender as reivindicações do povo, aprofun-dando assim o acordo Bloco/PS também no Algarve.
João Vasconcelos
*Deputado do BE na Assembleia da República