CANELA MAIS FINA

A Sotheby’s do mar

 

Sotheby’s é uma das mais antigas e prestigiosas leiloeiras do Mundo. Fundada em Londres em 1744 é hoje uma multinacional que organiza leilões de obras de arte em Londres, Nova York, Hong Kong, Genebra, Paris e Pequim, e com um volume de negócios de aproximadamente três mil milhões de dólares anuais. Muitos dos grandes tesouros do mundo, passaram por ela, como as jóias da duquesa de Windsor, o património de Jaqueline Kennedy Onassis, O Grito de Munch ou a Coleção Martin Luther King Jr.
Nunca assisti a um leilão na Sotheby’s e tanto menos recorri a ela para adquirir/vender obras de arte. Os últimos leilões a que assisti foram os de peixe miúdo (sardinhas, cavalas e biqueirões) e anteriormente os do atum. A minha imaginação estava programada para esses tempos, em que o leiloeiro não tinha um martelo para adjudicar a peça (como os leiloeiros de Sotheby’s), as frações eram de tostão e não de dólar, e nos leilões londrinos as ofertas são em crescendo, enquanto que nos leilões do peixe as ofertas são decrescentes.
Levantar às 03h30 não é muito fácil, para quem como eu gosta de dormir; mas valeu a pena. Fi-lo para assistir à venda (leilão) de duzentas corvinas (com um peso médio de 14,5 Kg) capturadas pela armação do Barril, propriedade da Real Atunara. Toda a operação decorreu numa ampla nave paralela ao cais de descarga e propriedade da Doca Pesca de Olhão, onde as corvinas foram transferidas do barco nodriza “Nagasaka” para contentores com gelo e posteriormente colocado em caixas. Procedeu-se então à pesagem de cada uma das caixas e cada uma foi etiquetada com um número, ficando registados no sistema todos os dados a ela respeitantes.
Às 05h00 chegaram os compradores que observaram cuidadosamente todos os lotes que iriam ser leiloados às seis horas. Nesse dia havia uma enorme quantidade e variedade de mercadoria, resultante da descarga dessa madrugada: Sardinhas gradas e petingas, cavalas, carapaus (brancos e negrões), chocos, lulas, polvos, robalos, tamboris, azevias, douradas e outras espécies em menor quantidade compunham aquele leque em que predominavam os tons “azul e prata”.
Às 06h00, quando iniciou a primeira venda, as bancadas diante do sistema eletrónico de venda encontravam-se cheias de compradores de comando em riste, preparados para arrematar os lotes que lhes interessavam e sempre que chegassem à sua cotação. Num ecrã colocado num ponto visível para todos, foram aparecendo em sucessão vertiginosa os vários lotes à venda, destacando-se o valor em euro. Sempre que um comprador premia o seu comando, parava a contagem decrescente e no ecrã aparecia o preço arrematado, o comprador e o número de caixas de peixe adquirido. Aquilo que me pareceu uma quantidade enorme de mercadoria para leiloar, “desapareceu” em pouco mais de uma hora e passado pouco tempo os compradores abandonavam as instalações, com a mercadoria recém comprada acondicionada nas viaturas isotérmicas a caminho dos seus locais de venda.
Quando iniciou a venda das corvinas, o leilão foi feito à unidade e em meia hora, também elas encontraram novo dono rumando grande parte para os mercados do Algarve, de além-Portugal e até da Andaluzia. Entretanto o “Nagasaka”, depois de reabastecer, fez-se de novo ao mar para trazermais um pouco de uma riqueza incalculável mas não inesgotável, na esperança que os Homens saibam mantê-la, prevalecendo o bom-senso à ganância.
Nesta madrugada assisti ao leilão de obras de arte que nenhum Homem jamais criou ou criará… e com os olhos cheios de belas imagens incomuns para mim, refletindo naquilo que havia visto e recordando com saudade os “longínquos” leilões vila-realenses, encontrei-me – eu, que até aqui não me considerava invejoso – invejando estes outros Algarvios que souberam, com esforço e competência, continuar a extrair do mar a enorme riqueza que ele oferece quotidianamente e que NÓS desaproveitámos.
Resta-me(nos) a esperança que o previsto “breve” desassoreamento da barra do Guadiana, de “mão dada” com políticos e empresários competentes, tragam para a nossa “Vila” um pouco do dinamismo que tive oportunidade de assistir nesta estival madrugada olhanense, sem desprezar os navios de cruzeiro pejados de turistas, que demandarão o nosso porto e “porão em brasa” os seus golden cards no nosso “Open Sky” Shopping Center.
Não quero terminar este relato sem fazer um elogio ao pessoal da Doca Pesca que nesta madrugada ofereceu uma prova de profissionalismo, “fazendo desaparecer” em pouco mais de duas horas – sem atropelos nem algazarra(*) -, aquilo que para mim, por ignorância ou erro de cálculo, tinha quantificado em muitas horas de trabalho.
(*) – O silêncio da madrugada só foi interrompido, de vez em quando, por um comprador gritando a plenos pulmões: CARAMELO… OH, CARAMELO!!!… Seria uma mensagem em código entre profissionais do métier?…
Luigi Rolla

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