SMS: Os livros roubados

Opinião de Carlos Albino

Tornou-se universal o provérbio islâmico de que se Maomé não vai à montanha, a montanha vem a Maomé. Foi o que aconteceu na sexta-feira 14, quando Ismail Serageldin, o diretor da nova Biblioteca de Alexandria – chamada Biblioteca Alexandrina para não se confundir com a antiga, a que acabaria por desaparecer num incêndio, ainda por esclarecer – quando resolveu mostrar como as novas bibliotecas usarão os meios eletrónicos ao serviço do livro. Veio explicar, ajudado por um power-point ilustrativo, como o futuro terá de associar os dois livros, o impresso e o digital, e como o segundo, filho do primeiro, servirá para criar mais pessoas instruídas, críticas, cultas e mesmo sábias. E veio dizer que, à semelhança do que se passou com os textos escritos no barro, que coexistiram durante séculos com os livros em papiro, e estes com os livros em pergaminho, e estes com os livros impressos em papel, assim os impressos coexistirão, durante muito tempo com os novos, os imateriais, os que se leem no computador e no ipad. Veio dizer que essa coexistência pode ser pacífica, se os meios forem bem utilizados, se os novos bibliotecários forem o que se espera deles – Educadores que terão o dever de guiar os jovens e as crianças na direcção dos livros, quando o mundo comunicacional, de tão intenso, profuso, descontínuo e contraditório, os deixa navegando num espaço sideral de desnorte de informações sobrepostas. Não nos esqueçamos nunca que a palavra desastre significa perder os astros.

Na grande sala da Gulbenkian, encontravam-se bibliotecários do Algarve que, à semelhança das centenas que enchiam o recinto, ficaram com o recado. Trouxeram, por certo o recado. Vamos acreditar que sim. E vamos esquecer, por um tempo, que as estatísticas colocam esta região no fundo da tabela da leitura em Portugal. Vamos imaginar que arrancamos na direção de uma estatística nova, aquela que coloque as crianças e os jovens deste “antigo reino”, num bom lugar da tabela, em relação a esse lugar nascente da leitura que conduz à sabedoria. Neste momento em que tanto se voltou a falar, com razão, nos livros roubados pelo pirata do conde de Essex ao Bispo de Faro, em 1596, o recado do Diretor da Biblioteca de Alexandria em território português deve ser lido como um aviso – Por favor, não se deixem roubar como antigamente, mas agora por vossas próprias mãos. Não queiram ser os roubadores de livros das gerações que se erguem para o futuro, quando tanto precisam deles. Para serem more informed, more critic, more independente. Palavras da montanha.

Flagrante arrepio na espinha: Se é verdade, essa história da Câmara de Faro querer vender uma peça única do Museu Municipal para conseguir umas coroas, é meio caminho andado para a candidatura a Capital Europeia da Cultura…

Carlos Albino

 

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