No que havia de dar esse boneco com que os cavaleiros medievais se treinavam para os torneios, alguns de vida ou morte. O estafermo servia para simular uma situação real de combate. O boneco girava preso a um eixo, de braços abertos na horizontal e em vez de uma das mãos era-lhe colocada uma arma que poderia ser uma clava, uma espada, uma alabarda ou uma maça, e no lugar da outra mão o estafermo ostentava um escudo. O ataque ao estafermo era desenvolvido a galope veloz pelo cavaleiro. Ao ser golpeado, o boneco girava obrigando o cavaleiro a treinar-se também em defesa.
Hoje, chamar-se estafermo ainda que seja a um boneco, é um insulto. De modo geral, ser um estafermo é ser estorvo, servir apenas para atrapalhar, levando porrada de todos os lados. Todavia, na realidade, os estafermos continuam a ser uteis a quem queira treinar-se para os modernos torneios, que não são poucos e por vezes tão ou mais violentos que os medievais embora tais torneios pareçam não ir além da guerra de palavras. Aliás, boa parte do desprestígio da política e dos políticos vem precisamente de, tantas vezes, se transformar um debate sobre assuntos do interesse geral num torneio entre dois cavaleiros, cada qual tendo-se treinado com o seu estafermo. E quanto melhor for o treino com o estafermo, tanto maior êxito se registará no combate.
Por isso, sendo condição imprescindível para os modernos torneios em que a espada é o insulto gratuito, a alabarda é a inventona, e a maça é a mentira proferida com a prévia garantia de impunidade, pode não ser já insulto identificar alguém como estafermo, alguém que, para treino do seu cavaleiro, leve porrada de todos os lados, não se importe e até goste. Nestas circunstâncias, qualquer estafermo que tenha contribuído para o êxito do seu cavaleiro, é apresentado como possuindo imensos dotes, elevada competência, lealdade à prova de alabarda, e com fortes probalidades até poderá ser condecorado.
Pelo se sabe e bem, já se justifica, em cada terra, um Monumento ao Estafermo.
Bem hajam.
(Próximo episódio: Os Luzicus)
“Flagrante verificação: No Algarve, a Cultura (não é o caso da Cóltura…) no verão recolhe-se à sombra porque tem calor, e no inverno não sai do gabinete porque tem frio.
Carlos Albino