SMS: Onde está o público?

A pergunta, no Algarve, é conforme. Caso se trate de sardinha assada, não falta e não há nenhum mal nisso – Deus criou os peixes para serem grelhados, embora isso destoe no Teatro da Figuras. Caso se trate de uma divindade forjada pela televisão, mesmo que pouco ou nada tenha na cabeça, público também não faltará e continua a não haver nenhum mal nisso ou só por isso – mesmo no paraíso cada um pode escolher a serpente que lhe apresente a melhor maçã. E caso se trate de um fado cantado por voz de passarinho, de uma banda com som amplificado como se um avião entrasse por uma orelha e saísse por outra, ou mesmo de três ranchos folclóricos à medida do orçamento da festa, haverá igualmente público garantido à medida, e nenhuma catástrofe daí virá, pois Deus também criou o fado, uma banda e um rancho ao sétimo dia, quando descansou. Nenhum mal nisso ou só por isso.

O problema é quando um grande pianista como Artur Pizarro se apresenta no Teatro das Figuras e a sala fica por metade; quando pinga no Algarve alguma boa peça de teatro e, fora a sessão dos convites seletivos, as cadeiras ficam vazias; e quando se anuncia um conferencista de topo e é preciso pescar público para a terceira fila. E problema também quando a uma pretensa sessão “cultural” com algum ouro, prata e bronze da casa, ou muita da lata de casa, e acorrem apenas os tios e primos dos organizadores, os funcionários autárquicos e adjacentes do costume, se o senhor presidente for, além de supostos simpatizantes que nada leram do escritor, se for um escritor, que nem por certo irão ler. E mesmo nestas sessões, o problema fica agravado quando os que deviam estar atentos não se despegam das mensagens de telemóvel num afã ininterrupto de gente à beira da surménage, abandonando ao intervalo alegadamente para pregação noutra aldeia, com público idêntico.

É claro que, nestas circunstâncias, a última coisa que se pode fazer é culpabilizar seja quem for. O problema de público no Algarve é social e sociológico. As elites locais que, por regra, devem gerar públicos de referência, estão desenraizadas por opção ou por inércia, e mesmo desinseridas da sociedade onde vivem e trabalham. Professores em trânsito e saturados da burocracia escolar, advogados que têm mais em que pensar, médicos por certos desejos de escapadela da província; economistas para quem quase tudo está fora do âmbito; e um sem número de novos especialistas que, sem se darem conta, prosseguem o velho problema de menosprezo da instrução pública e da aprendizagem contínua, tudo isto contribui para que não haja públicos e públicos críticos que não se verguem ao encómio ou à hostilidade. Não há que culpar ninguém porque o problema é estruturalmente social e sociológico, numa sociedade que até para conhecer os seus mortos apenas tem um meio – o aviso por fotocópia colada na parede, ou por recado no café da manhã.

Flagrantes votos: De bom e isento desempenho para Francisco Serra, como Presidente da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Algarve.
Carlos Albino

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