SMS

Primárias para Deputados e Presidentes de câmaras

Toda a gente, de uma maneira ou doutra, fala da “crise da democracia”. E se é verdade que uns sabem bem qual é o problema e o que é que a põe em crise, outros dissimulam o que é que está em causa, falam no vago em reforma sem indicarem a reforma de quê, por certo na expetativa de virar o disco e tocar a mesma música. Falando claro, uma democracia entra em crise quando o acesso à representatividade dos eleitores em pouco ou nada difere dos procedimentos de um regime autoritário, e quando a eleição mais não é do que uma mera formalidade de legitimação de gente nomeada e, no fundo, previamente imposta. Entra em crise, quando os candidatos ao poder são pré-determinados por pequenos grupos auto-organizados, os quais tendo capturado os partidos confinando-os a si mesmos, estão longe de representarem as grandes áreas alargadas do eleitorado. Portanto, na prática, nomeiam os futuros eleitos, independentemente da qualidade, da honestidade e das provas dadas. Se as circunstâncias propiciam a chamada sorte eleitoral, os nomeados ganham a sorte grande. Quando a democracia entra em crise, o que é preciso é ganhar, não se olhando ao comportamento do eleitorado que, cada vez mais descrente, dá a resposta que pode dar: a abstenção galopante, o desligamento crescente pela Causa Pública, a indiferença, o tanto faz que seja este ou aquele.

Recentemente, o Partido Socialista teve a coragem de quebrar a onda em que já ia distraído no seu longo surf do poder, surf esse que, entre nós, já é modalidade olímpica. Começou e concretizou esse quebrar de onda, submetendo a escolha do seu próximo candidato a primeiro-ministro aos declarados simpatizantes da sua área eleitoral, não o deixando refém do reduzido esquema de sócios. A resposta foi imensa, deixando patente aqui e ali, o contraste entre a área eleitoral e o esquema fechado do sínodo partidário, com seus bispos regionais e monsenhores locais. O Partido Socialista abriu-se e já obrigou os outros partidos a repensarem procedimentos, todos eles a não poderem já esconder o que significa isso de “crise da democracia”. As primárias funcionaram, sabe-se hoje como essa consulta é possível e como é mobilizadora. No Algarve, particularmente, tirou um retrato que obriga a pensar, levando a concluir que, caso se queira resolver a “crise da democracia”, deve-se ir mais além.

Candidatos a deputados predeterminados por pequenas cliques regionais para os calculados “lugares elegíveis”, candidatos a presidentes de câmara por escolha concertada entre grupos de militantes com quotas em dia mas cada vez menores em número, em atividade e em qualidade, de eleição em eleição, foram fazendo o seu estrago, porque cada eleição, em relação à eleição anterior, foi acentuando mais a conquista do poder do que o exercício do mesmo poder. Foi acentuando o significado de “carreira política” mais como uma espécie de carreira profissional para a satisfação de interesses pessoais ou difusos, e menos como missão de elevado interesse público, pautada pelos valores da ética política, pela proba representatividade dos eleitores e pela defesa atenta dos problemas concretos das populações e dos diversos agentes da Sociedade.

Se o Partido Socialista deu exemplo pioneiro para a escolha do seu candidato à chefia do governo, que avance com o mesmo pioneirismo com primárias regionais para a próxima escolha dos seus deputados e depois com primárias concelhias para a escolha dos seus candidatos às presidências de câmaras.

O recurso a pré-sondagens, a sondagens e ao marketing político por via do qual muitas vezes se elevou nos outdoors um sultão de Marraquexe à escala de Presidente da República engravatado, fez parte de um período que já deu tudo o que tinha a dar. A “escolha” não é por aí. Esse recurso acabou. Acabou e contribuiu muito para a “crise da democracia”. Insistir nesse erro é chamar, por certo sem querer, a cultura do autoritarismo dissimulado – dissimulado até ser assumido, e então nem haverá crise.

Flagrantes cortinas de ferro: O que se diz que a REFER fez em Olhão (dividindo a cidade) e o que já se fez na chamada “requalificação” da 125 e por certo se vai continuar a fazer (dividindo populações), não é só espécies de Tejo a dividir Lisboa de Almada. São cortinas de ferro.
Carlos Albino

 

Deixe um comentário

Exclusivos

Liberdade e democracia na voz dos mais jovens

No 6.º ano, o 25 de abril de 1974 é um dos conteúdos programáticos...

Algarve comemora em grande os 50 anos do 25 de Abril -consulte aqui a programação-

Para assinalar esta data, os concelhos algarvios prepararam uma programação muito diversificada, destacando-se exposições,...

Veículos TVDE proibidos de circular na baixa de Albufeira

Paolo Funassi, coordenador da concelhia do partido ADN - Alternativa Democrática Nacional, de Albufeira,...

Professor Horta Correia é referência internacional em Urbanismo e História de Arte

Pedro Pires, técnico superior na Câmara Municipal de Castro Marim e membro do Centro...

1 COMENTÁRIO

  1. Pondo os nomes aos ditos… O Algarve sempre foi um refinado feudo aprisionado por grupos de maioria exclusivista que sempre dominaram estes antigos reinos dos algarves. Esses grupos, tal como antigamente, ainda hoje praticam: a exclusão, e a discriminação, redundando em segregação
    Os tempos de hoje em nada diferem dos de outrora (da outra senhora). As famílias continuam instaladas nos seus ancestrais cadeirões, interrogando quando algum outsider tem a ousadia de intervir nos seus interesses instalados, conotados com os negócios, já que os outros, os das letras, isso é coisa para mulheres ou para os comunistas. A eles, aos chefes do grupo continua a pertencer a máxima e única palavra: admitido ou recusado, como a quem ferra gado.
    Claro que, o presente artigo do Carlos Albino é uma ousadia, que apenas lhe é permitida pelos seus créditos adquiridos através do seu percurso de vida preocupado com a envolvência do meio que o cerca, cada vez de forma mais agravada com o decorrer desta dita democracia. Isto agora é uma corporocracia, onde impera um poder obscuro respaldado pelos bastidores, em que nem sequer as sombras se vislumbram. Mas esse poder existe sob as mais diversas formas geométricas políticas perspectivadas com uma linha de fuga perfeitamente dedutível.
    Este alvitre de hoje de Carlos Albino, no fundo é um GRITO, tentando dizer que é necessário remexer este caldo entornado que começa a correr o risco de pegar-se ao fundo do taxo. E o povo algarvio, na sua esmagadora maioria, porque é pobre ou remediado, jamais gostou de deglutir comida retardada, e muito menos esturricada.

Deixe um comentário

Por favor digite o seu comentário!
Por favor, digite o seu nome

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Fica a saber como são processados os dados dos comentários.