OPINIÃO: Estagiários ou o trabalho não pago no Algarve

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Colaboradora. Designer.

Opinião de Vasco Cardoso

A moda parece estar a pegar e percebe-se porquê. Vindos de todo o país, centenas, senão mesmo milhares de jovens, estão a ser recrutados para hotéis, resorts, restaurantes ou campos de golf, sob a figura de “estagiários” para trabalharem durante o período de verão no Algarve. Este fenómeno não é novo, mas tem vindo a ganhar proporções de escândalo pela dimensão da exploração a que muitos estão a ser sujeitos. Seja os que vêm das várias escolas de hotelaria espalhadas pelo país, seja os que entram dentro das unidades hoteleiras por outra via (mas com igual estatuto remuneratório), estes jovens dobram toalhas, fazem camas, servem às mesas, lavam loiça, cortam relva, limpam piscinas, atendem nas recepções, fazem manutenção de equipamentos e todas as milhentas actividades que se desenvolvem na área do turismo, com uma diferença: não recebem salário.

Trabalham em dezenas de estabelecimentos na região e, na esmagadora maioria dos casos, apenas em troca de cama e mesa e, quanto muito, um pequeno subsídio (de transporte, alimentação, etc). O seu horário de trabalho é muitos casos indefinido e o futuro uma incerteza.

Muitos dos jovens são empurrados para estas circunstâncias seduzidos pela necessidade de formação e, sobretudo, pela concretização da possibilidade de poderem no final ter acesso a um contracto de trabalho que quase nunca chega aparecer.

Com o recurso a trabalhadores “estagiários” conjugado com o fornecimento de trabalhadores pela empresas de trabalho temporário, as grandes cadeias de hotéis (e não só) não só arrecadam milhões de euros de lucros de trabalho não pago, como eternizam as situações de precariedade e sobre-exploração que se verificam no sector. Chegam relatos da construção de camaratas para este verão de 2016 em várias unidades hoteleiras, destinadas a receber estes “escravos” do nosso tempo, e tudo isto, debaixo das luzes deslumbrantes dos números do turismo na região: mais turistas, mais dormidas, mais receitas, mais milhões de euros de lucros que nunca chegam para aumentar salários, pagar horas extraordinárias, para assegurar a estabilidade do emprego.

O emprego não é uma dádiva, nem um privilégio, é um direito dos trabalhadores. O que esta situação dos trabalhadores “estagiários” na hotelaria do Algarve demonstra é que os níveis de exploração foram tão longe que já se considera “natural” estar três ou quatro meses num hotel sem direito a qualquer salários, com a completa conivência das autoridades que vão olhando para o lado. É necessária formação profissional, sim! Com condições, com direitos, com retribuição, com dignidade. Aquilo que se está a verificar neste sector com o recurso aos estagiários não é nada disso: é trabalhar, sem receber. É preencher postos de trabalho permanentes com o recurso a estagiários.

No Algarve, só há turismo porque há trabalhadores. Há sol e praia, há hotéis e restaurantes, há estradas e aeroportos, mas nada disto funciona, sem trabalho, sem trabalhadores, sem aqueles que produzem a riqueza. O brutal ataque a que os trabalhadores portugueses têm sido sujeitos, particularmente nos últimos 4 anos de governo PSD/CDS, precisa de ser travado e revertido. Com a luta, os trabalhadores repuseram feriados que tinham sido roubados ou o horário das 35 horas na administração pública. E só com a luta, será possível inverter a situação de sobre-exploração que se está a procurar implantar na hotelaria da região.

 

Vasco Cardoso


*Membro da Comissão Política do PCP

 

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