Opinião de Cristóvão Norte
A feliz expressão que titula o artigo serve, ainda hoje, para assinalar o facto do Algarve ser um destino turístico de inegável sucesso, reservando, ainda assim, um renovado potencial de descoberta que pode fortalecer o tecido económico regional. Hoje, talvez com menor propriedade, aproprio-me em sentido impróprio desta expressão. Ela, na política nacional, representa o que todos sabem. Serão necessárias medidas de austeridade ou, como hoje eufemisticamente se cognominam, medidas restritivas, o que para os mais fanáticos ou menos observadores pode soar a coisa estruturalmente diferente. Mas não é. E o pior não é isso. O Governo sabe que tem as contas mal feitas e desconfio que alguns, ainda que as contas estivessem bem feitas, não desconhecem que o caminho esteja errado.
Qual o problema? Muito simples: recuperamos a via do consumo privado que cresce a um ritmo maior que o PIB, abandonamos os incentivos ao investimento que são essenciais para criar emprego, somos temerários a aumentar os custos, alienamos a competitividade das empresas e, enfim, como no passado, parece que esquecemos que estamos numa economia globalizada de padrão competitivo, que enfrentamos uma concorrência voraz e que temos que ser melhores. As facilidades pagam-se depois. Todos sabemos, embora por vezes disfarcemos muito bem. Viver do curto prazo não é solução, parece que estamos na crista da onda por vezes, mas quando ela rebenta somos submergidos com tamanha violência que a recuperação é madrasta. E, depois, sem aprender, confundimos as causas com as consequências.
Não aprendemos, isso é facto consumado. Os outros também não facilitam, em abono da verdade. Mas há coisas que dependem de nós e somos nós que as inquinamos. Todos sabemos o que vem aí na segurança social e cruzamos os braços; na natalidade para a frente também não andamos; e, vezes demais, os corporativismos capturam o essencial das decisões políticas. No fundo, transformar tem que ter o assentimento dos cidadãos. Em Portugal, não tem, regra geral. Acudir aos corporativismos serve bem melhor as cumplicidades políticas e o faro de conservação do poder. Quem não o faz sucumbe ou estagna, as mais das vezes.
Mudar isto compete aos cidadãos. Já sabemos que a montanha pariu um rato. Era um choque de curto prazo, reposições de rendimentos imediatos e afins. Dinheiro que não seria mal entregue se o diabo ainda não estivesse atrás da porta, mas está, e daqui a pouco vai lá bater novamente. Pedir-nos coisas que teremos que aceitar porque fomos imprevidentes. Coisas que devíamos ser nós a fazer, mas que preferimos ser governados por outros e mutilar a nossa dignidade.
Tudo está a ser revisto em baixa. Previa-se um crescimento de 2,4 por cento no célebre plano Centeno e, no pior dos cenários, já vamos nos 1.3. É um rombo. Gigantesco. Se fosse o consumo privado não me preocuparia muito, mas é o investimento privado. As empresas não têm dinheiro, tem que vir lá de fora, mas alguns proferem umas proclamações que os assustam e quem está lá fora não mete dinheiro cá dentro. A instabilidade está a deixar mazelas, e muitas delas só se sentirão quando percebermos que sem criarmos cá, sempre que aumenta o consumo privado estamos a mandar para fora e a ficar mais expostos aos riscos implacáveis dos mercados..
Esta ideia não devia ser de partido nenhum, é elementar, mais a mais quando o consumo é em termos relativos o segundo mais alto da Europa.
Regiões como o Algarve têm a mais a perder com isto: são economias abertas, em franca competição e os impostos e taxas têm um efeito mais devastador no nosso tecido económico. Contas arrumadas são mais importantes para o Algarve. Devemos zelar por isso. Afinal, aqui em sentido próprio, queremos continuar a ter o segredo mais famoso da Europa.
Cristóvão Norte
(Deputado do PSD na Assembleia da República)