CANELA mais FINA

Roteiros de incongruências

O Público on-line de 8.VII publicou uma notícia cujo título reza assim: «Um pequeno trajecto que percorre uma grande história das conservas, entre exposição de latas históricas, provas e vendas ou a ‘maior sardinha do mundo em crochet/tricot”.»

[…] «Um roteiro cheio de lata”. É assim que se anuncia a 1.ª Rota das Conservas Portuguesas, a decorrer em Julho e Agosto. Resultado de uma parceria da Associação Nacional da Indústria de Conservas de Peixe com os diversos espaços, a rota vai começar por propor locais num “percurso cultural e gastronómico pelos sabores do mar no centro da cidade de Lisboa, com o objectivo de dar a conhecer a vasta e rica cultura desta indústria centenária.»

[…] «No Story Centre (Terreiro do Paço) é dado o pontapé de saída com a exposição Latas de Conservas de Outros Tempos – “a mais completa colecção privada de latas de conservas portuguesas, coleccionadas ao longo de 30 anos por Carole Garton”: são mais de 200 latas das “mais variadas marcas e empresas icónicas” (cedidas temporariamente pelo Centro de Artes Culinárias de Lisboa).»

[…] «…a rota prossegue pelo Can the Can, espaço onde é possível “degustar deliciosos petiscos onde as conservas tradicionais têm uma presença privilegiada”, tanto na ementa como na decoração. Os visitantes serão recebidos com uma bebida de boas-vindas “mediante o consumo de uma refeição e apresentação do respectivo voucher (lata)”.» 

[…] «O passeio segue para a Rua do Arsenal, onde a Loja das Conservas nos espera. É uma “montra de 18 empresas portuguesas de conservas” e, sublinha a organização, “o maior espaço comercial de conservas no nosso país” (“conta actualmente com mais de 700 referências”).»

[…] «Experiência proposta: uma cravadeira à disposição dos participantes, instrumento que permitirá a cada um fechar uma lata de conservas. Na loja, na compra de uma lata de conservas tem-se direito a uma gratuita, mediante a apresentação da lata-voucher.»

Perante esta notícia, tentei encontrar uma analogia entre as conservas de peixe, as latas de conservas, as cravadeiras e Lisboa, e não encontrei. Penso que esta louvável iniciativa deve-se somente ao empenho da ANICP e aos vários espaços comerciais intervenientes. Mas recriar em Lisboa um roteiro que recorre a “grande história das conservas de peixe” e que 1.ª Rota das Conservas Portuguesas decorra em Lisboa, não deixa de ser uma incongruência.

Vossemecês já imaginaram, se um dia realizassem, em Olhão o “roteiro do chouriço”, em Serpa o “roteiro do carapau alimado”, em São João da Madeira o “roteiro do polvo”, na Fuzeta o “roteiro do calçado”, em Monte Gordo o “roteiro do queijo da serra”, em Seia o “roteiro da conquilha”, em Sernacelhe o “roteiro do percebe”, ou em Aljezur o “roteiro da castanha”?

Nós temos um pequeno museu dedicado às Conservas de Peixe situado no Arquivo Histórico Municipal, que seria o palco ideal para se “falar” sobre as conservas de peixe – especialmente de atum – e indústrias afins e que tiveram na nossa terra a sua capital inquestionável. Neste ambiente ideal e com a entreajuda de homens de boa vontade, comerciantes e restauradores, e a indispensável colaboração da Confraria do Atum, poder-se-ia fazer algo interessante que não deixasse morrer esta ligação da “Vila” ao mar.

Mas não, na nossa Terra, mercê duma ligação incon-gruente ao Caribe, e no seguimento dos vários eventos culturais que se sucedem por cá todos os anos, não me estranha que realizemos qualquer dia o “roteiro da cana-de-açúcar”, o “roteiro da rumba e da salsa”, o “roteiro del aijaco”, o “roteiro del chicharron”, o “roteiro do rum” ou o “roteiro do José Martí”. Porque estes sim, graças “ao denodado empenho dos governantes de cá e de lá”, mantêm vivos os laços históricos, fraternos e inquebrantáveis que ligam Vila Real de Santo António “ à vizinha” Cuba.

Atenção, não me interpretem mal… não vejo mal que se ensine aos nossos netos as biografias de José Martí ou as dos hermanos Castro, mas os nossos netos também deveriam ficar a saber que a grande maioria dos avós vila-realenses ganharam a vida com o ATUM e as SARDINHAS.

P.S.: 1) «A propósito da minha crónica de 2.VII.2015 “Histórias de cobardes e de heróis”, a Senhora Dr.ª Maria da Conceição Cabrita digníssima Vice-Presidente da Câmara Municipal de VRSA teve a gentileza de me corrigir, informando que o cachet da actuação do Anselmo Ralph no Estádio Municipal foi integralmente suportado pela empresa organizadora da IIIª Copa do Guadiana. Registo com prazer a retificação, até porque cem mil euritos são uma quantia enorme, até para uma autarquia como a nossa.»

2) «Ainda os Parquímetros: Pena é que Aqueles que se insurgiram com veemência – LEGITIMAMENTE? contra a implementação destes “saca moedas” na nossa Cidade, nunca se tenham insurgido contra o estacionamento selvagem das viaturas nos passeios, que obrigam os deficientes motores – e não só ? a circular pelo “meio da rua”.

Parquímetros NÃO e carros encima dos passeios NI, porquê?

A resposta é simples. Porque um carro encima do passeio é “um potencial cliente”!…

[email protected]

Luigi Rolla

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1 COMENTÁRIO

  1. A palavra “LEGITIMAMENTE” está precedida erradamente por um ponto de interrogação (?), quando no texto original consta um travessão (-). Eu não ponho em dúvida a legitimidade daqueles que se opõem ao uso dos parquímetros.

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