Alemanha isolada no G20

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Wolfgang Schaüble ficou isolado na estratégia de curto prazo para impulsionar a retoma económica

“A Europa tem de fazer mais”, acentuou o secretário do Tesouro norte-americano Jack Lew resumindo uma das críticas que tiveram o acordo da maioria dos ministros das Finanças e banqueiros centrais do G20, cuja reunião terminou este domingo ao final da manhã (hora local) em Cairns, na Austrália.

Lew referiu que permanecem diferenças “filosóficas” com alguns parceiros europeus em torno das medidas de estímulo de curto prazo para impulsionar a retoma económica. O secretário do Tesouro de Obama ressaltou o risco de na Europa “os esforços para impulsionar a procura serem diferidos demasiado de modo que o vento contrário tornar-se-á mais forte”.

A crítica tinha como alvo a Alemanha representada pelo ministro das Finanças Wolfgang Schaüble que reafirmou a posição de prioridade às reformas estruturais e a um controlo orçamental estrito. A Reuters referiu que um membro da delegação alemã frisou que “não concordamos com estímulos de curto prazo” e que “a dívida está ainda demasiado elevada para permitir aumentar a despesa pública”.

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Retirar pressão sobre a política monetária

A posição alemã choca-se com o compromisso alcançado no sentido de prosseguir uma “mistura” de quatro estratégias: política monetária, em particular onde se tornem necessárias medidas adicionais de combate aos perigos da deflação onde estes forem evidentes; reformas estruturais, um dos cavalos de batalha do Fundo Monetário Internacional (FMI) e do Banco Central Europeu (BCE); uma “composição inteligente” da despesa pública e da carga fiscal, com iniciativas orçamentais no curto prazo onde for apropriado; e um impulso às infraestruturas, dado o seu potencial para lidar com a “fraqueza da procura”.

Nesta “mistura”, o comunicado da reunião sublinha que é preciso “retirar pressão sobre as políticas monetárias”, tanto mais que se avizinha uma divergência crescente entre a desativação dos estímulos e a subida das taxas diretoras de juros pela Reserva Federal norte-americana (FED) e pelo Banco de Inglaterra e a manutenção de uma estratégia contrária por um período mais prolongado pelo BCE e pelo Banco do Japão.

Os impactos globais da “normalização” da política monetária por parte da FED foram uma das preocupações centrais da reunião, com o comunicado final a louvar a “forma cuidada” como a presidente da Reserva Federal, Janet Yellen, está a lidar com o assunto.

Num documento preparatório da reunião elaborado pelo FMI apontava-se a necessidade de “prevenir um aperto monetário prematuro” nas economias desenvolvidas. Os efeitos de mudanças bruscas de política monetária – sobretudo depois de um período de sete anos de “estímulos monetários” com taxas diretoras em mínimos e pacotes de quantitative easing amplos ou mais envergonhados – geram alta volatilidade nos mercados financeiros e “correções abruptas” do risco de crédito, chamava a atenção a “Nota” do FMI para a reunião do G20.

Iniciativa Global para Infraestruturas

A Austrália é este ano o anfitrião das atividades do G20, cuja cimeira de chefes de Estado decorrerá em Brisbane em novembro. A reunião que terminou este domingo em Cairns juntou os ministros das Finanças e Economia e os banqueiros centrais do grupo além do FMI e da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE). A Espanha participa como convidada desde 2010.

A meta das reuniões do G20 deste ano é definir um pacote de medidas que permita aumentar em dois pontos percentuais o crescimento mundial em 2018. Neste sentido foram recolhidas mais de 900 propostas. A análise prévia realizada pelo FMI e pela OCDE aponta para um impulso adicional de 1,8 pontos percentuais. Pelo que a reunião incumbiu os seus membros de procurarem até novembro colmatar os 0,2 pontos percentuais em falta.

No centro do pacote está o que foi denominado de “Iniciativa Global Pluri-Anual a favor das Infraestruturas”, um ponto a que a “Nota” do FMI já se referira como “ação decisiva” e que é um cavalo de batalha da Austrália, que alguns analistas consideram estar interessada em sediar o futuro “Centro Global de Infraestruturas”.

A Iniciativa – apoiada antecipadamente pelo FMI e pelo secretário do Tesouro norte-americano Jack Lew – pretende criar uma plataforma de troca de informação de projetos à escala global com vista a “casar” iniciativas públicas e investidores. A plataforma pretende desenvolver uma contratação estandardizada que reduza custos aos investidores. A “Nota” do FMI já havia referido que estão claramente identificadas as necessidades de infraestruturas quer em países desenvolvidos – sendo citados os casos dos Estados Unidos e da Alemanha como exemplos de degradação desse sector – quer em economias emergentes, referindo os casos mais prementes do Brasil e da Índia.

A revista “Der Spiegel” publicou a 18 de setembro, antes do início do G20, uma análise arrasadora da situação na Alemanha, intitulando o artigo de um modo muito sugestivo: “A Infraestrutura doente da Alemanha: Uma Nação que se desfaz lentamente”.

A reunião analisou, ainda, outros pontos como o combate à evasão e optimização fiscal por parte das multinacionais, a necessidade de “almofadas” financeiras ainda maiores por parte dos bancos globais sistémicos (Christian Noyer, presidente da direção do Banco de Pagamentos Internacionais, falou de um rácio de 16% em relação ao risco dos ativos), a exigência de transparência nos derivados financeiros complexos, e a análise pelo FMI das medidas propostas pela Associação Internacional dos Mercados de Capitais em relação a cláusulas para combater a litigância nas reestruturações de dívida soberana (assunto a que o Expresso já se referiu).

Os membros do G20 incluem a União Europeia, os países do G7 (Alemanha, Canadá, Estados Unidos, França, Itália, Japão e Reino Unido), a África do Sul, Arábia Saudita, Argentina, Austrália, Brasil, China, Coreia do Sul, Índia, Indonésia, México, Rússia e Turquia. Assistem, ainda, a OCDE e o FMI, e como convidado, desde 2010, a Espanha.

A presença do presidente da Rússia na cimeira de chefes de Estado de novembro em Brisbane ficou em aberto.

RE

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