A “sorte” tem estado do lado dos banhistas

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Este ano já foram registadas 22 derrocadas no litoral algarvio, mas até agora sem provocar vítimas

O problema das derrocadas nas praias só não fez mais vítimas na costa algarvia porque os desabamentos de arribas acontecem, quase sempre, por alturas do inverno. No entanto, este está a ser um ano anormal, com mais do dobro das derrocadas verificadas em 2015. A associação Almargem e a Administração Regional Hidrográfica (ARH) do Algarve não se entendem em relação à melhor solução para evitar uma nova tragédia

Se uma falésia desabar sobre o areal por estes dias será muito difícil evitar uma nova tragédia no Algarve, tal como a que vitimou cinco pessoas, em agosto de 2009, na praia Maria Luísa, em Albufeira.

No passado dia 6, surgiu um novo alerta, com mais uma derrocada naquela praia, mas desta vez sem provocar vítimas. Porém, o incidente podia ter tido consequências mais graves.

Segundo a associação Almargem, esta nova derrocada numa das extremidades da praia Maria Luísa permitiu de novo perceber “uma atitude inconsequente e cínica por parte da Agência Portuguesa do Ambiente (APA)”.

Segundo a associação de defesa do património cultural e ambiental do Algarve, não basta afixar à entrada das praias um mapa onde são demarcadas as zonas de risco, nem fixar letreiros para demover a ocupação dessas zonas pelos banhistas. “Como se sabe, tal não tem acontecido, em grande parte porque a maior parte das pessoas não tem paciência nem condições para interpretar devidamente as indicações do mapa e, muitas vezes, nem sequer reparam nos letreiros que não podem obviamente ser colocados metro a metro”, refere a associação.

Almargem propõe solução, ARH diz que é impraticável

Por seu lado, a Almargem propõe a demarcação das zonas de risco no próprio areal, “com auxílio de estacas de madeira e corda, pelo menos nas áreas acima do nível máximo da maré cheia”. “A presença de banhistas nessas zonas tornar-se-ia assim muito mais visível e reprovável, garantindo que a maioria das pessoas se mantivesse em zonas mais seguras”, defendem os responsáveis.

A associação adianta, ainda, que esta medida só não avança, bem como a autuação dos banhistas que não respeitam os sinais, “para tentar não macular a imagem pretensamente idílica de um Algarve com praias selvagens e intocadas, capazes de acolher o máximo número de pessoas”.

A maioria das pessoas não tem paciência nem condições para interpretar o mapa das zonas de risco, nem reparam nos letreiros, critica a Almargem
A maioria das pessoas não tem paciência nem condições para interpretar o mapa das zonas de risco, nem reparam nos letreiros, critica a Almargem

Em declarações ao JA, Anabela Dores, técnica da APA-ARH do Algarve, comenta que “esta solução é impraticável”, justificando que “o nível máximo de maré cheia muda de 12 em 12 horas, sendo influenciado ainda por fatores como a amplitude da maré e as condições de agitação marítima”.

Questionada sobre as “medidas extraordinárias” que poderão ser tomadas para evitar que os banhistas continuem a frequentar as zonas de risco nas praias com arribas, a responsável salienta que a APA-ARH do Algarve vai continuar a apostar nas “medidas de prevenção possíveis”, que passam pela “observação sistemática do estado das arribas, o saneamento (derrocada controlada) das arribas identificadas pelos técnicos e a colocação de placas de sinalização com a identificação das faixas de risco”.

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Polémica em torno da intervenção humana

A Almargem sustenta ainda que a “intervenção do homem” está na origem de um número cada vez maior de desmoronamentos, “devido à ocupação indevida da borda das arribas por construções e, como acontece na própria praia Maria Luísa, por extensos arrelvados, regularmente regados, o que, certamente, não ajuda a diminuir a sua erosão natural, muito pelo contrário”.

A associação aponta mesmo o caso de uma derrocada noturna verificada em 2015, na mesma praia, defendendo que terá sido “uma consequência direta de uma inexplicável intervenção da APA, com construção de passadiços e de um miradouro em cima da arriba instável”.

Já Anabela Dores, da ARH do Algarve, considera “um absurdo” atribuir um desmoronamento a “uma guarda de madeira, cuja função é evitar que as pessoas passem para além da delimitação”. “Da mesma forma que não faz sentido afirmar que as pessoas andarem na crista das arribas provoca desmoronamentos”, reforça.

Acerca da influência humana nas derrocadas, a responsável da ARH refere que “78% das arribas caem devido à ação direta do mar e da chuva, 19% por atingirem o seu limite e apenas 3% podem ser atribuídos à intervenção do homem, mais precisamente à água que está associada aos edifícios”.

Ou seja, contrapõe Anabela Dores, “os desmoronamentos que estão associados à intervenção humana têm a ver com roturas de piscinas e de canalizações de abastecimento de água”, sendo que o problema, nestes casos, “é que não se consegue ver a água que se infiltra na arriba devido a estas roturas”.

Turismo de massas em ambientes naturais

Assim sendo, a APA-ARH do Algarve garante que “não são os edifícios, em si, que desencadeiam os desmoronamentos, já que as construções no topo das arribas são equivalentes a mais uma camada de rocha na arriba, pois, caso se pudesse estabelecer uma relação direta entre as construções e as derrocadas, as arribas mais altas caíam mais”.

Mas a associação Almargem não concorda com esta justificação e afirma que estas entidades estão a tentar “compatibilizar o incompatível – turismo de massas e ambientes naturais”.

Entretanto, todos esperam que a “sorte” esteja do lado dos banhistas e que não ocorram mais derrocadas até ao final deste verão nas praias algarvias. Só nos primeiros oito meses do ano, já foram registadas cerca de 22 ocorrências no Algarve, contra as nove registadas em todo o ano passado. Estes são números preocupantes que devem alertar os banhistas para os perigos das derrocadas, que são sempre inesperadas e potencialmente mortíferas…!

(NOTÍCIA PUBLICADA NA EDIÇÃO DO JA DE 18 DE AGOSTO)

Nuno Couto | Jornal do Algarve

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